Uma vida na Internet

A dependência da Internet
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Se uma borboleta Monarca vive no máximo seis semanas, sendo duas semanas como lagarta, uma semana em casulo e outra como adulta, uma tartaruga pode chegar aos duzentos anos, enquanto os humanos ficam-se pelos 80.

Os últimos estudos mostram que a esperança de vida em Portugal é de 78 anos e que desses setenta e oito anos, vinte e quatro são a dormir. Se dormir é uma necessidade para recuperarmos energia, pode também ser considerado um desperdício, pois depois de mortos teremos todo o tempo do mundo para descansar.

Ainda num outro dia fui jantar fora com a Cristina – que é um dos poucos prazeres da vida que não abdicamos – e na mesa ao lado estava um grupo a festejar o aniversário de alguém. O estranho não era um grupo de pessoas se juntar para festejar mas sim reparar que a maioria dos presentes estava absorvida pelo seu telemóvel, que só abandonaram quando foi a altura de cantar os parabéns.

Nestes tempos modernos falar e conversar com as pessoas tornou-se chato porque é mais fácil ter assuntos mais interessantes na ponta dos dedos de um telemóvel ligado à internet. Quem melhor que o Google ou que a Alexa para nos entreter e nos compreender? Ao contrário das pessoas, o Google não contraria as nossas opiniões e a simpática Alexa faz tudo o que desejamos.

Mas o exemplo da absorção pela informação fácil e mastigada não é apenas dos outros. Há uns anos atrás pedi a um empregado de um restaurante que levasse os telemóveis da Cristina e do Francisco para que pudéssemos jantar em família, o empregado riu-se e os dois ficaram amuados.

A adictologia pela Internet é tão perigosa como a dependência de drogas e os maus exemplos não são apenas dos outros. Cá em casa a Cristina já não vê as telenovelas da SIC! Ela “ouve” as novelas, enquanto navega no Instagram ou no WhatsApp entretida a enviar e a responder a mensagens de outros dependentes. Não são raras as vezes que, com a aplicação do Google Home do meu telemóvel, mudo de propósito o canal da TV para ela só se aperceber uns minutos depois.

Os exemplos de dependência da Internet não se ficam por aqui, lembro-me  do último corte geral de energia que tivemos cá em casa, em que a preocupação não era os alimentos do congelador correrem o risco de descongelar e se estragarem, mas sim termos ficado sem TV e Internet porque o Router da NOS desligou-se com o corte de corrente.

Embora seja um duro crítico do tempo que se perde na Internet, sou também um mau exemplo de dependência pois há mais de trinta anos que não leio um livro em papel e que não vou ao cinema. Mas quem é que quer ir ao cinema quando tem um disco com os últimos filmes que vê quando lhe apetece sem ter de cumprir os horários das sessões de um cinema? E quem é que agora lê um livro de papel cheio de mofo quando toda a cultura do mundo está à distância de um clique de um rato?

Se a nível familiar a dependência da internet é um facto consumado, a nível profissional a disponibilidade imediata da informação leva-nos a perder o incentivo para memorizar e a evoluir porque sabemos que em qualquer altura podemos recorrer à cábula da Internet. Quantos de nós é que ainda se lembra quanto é que é 8X8, sem recorrer à calculadora do telemóvel?

A triste realidade do mundo tecnológico é que, como passamos 24 anos a dormir e outros 25 na Internet, a vida está a ficar demasiado curta para se ser feliz.