Cálculos de gota a gota!

Chuva de gota a gota sem nexo
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Lembro-me que um dos meus professores do IST depois de ler o Draft do meu Projeto Final de Curso ter-me dito “não percebi nada”, devolveu-me o documento, e disse-me que eu tinha de reescrever tudo de novo de modo a que até a minha mãe percebesse. Voltei a reescrever todo o documento e aprendi assim que explicar assuntos complexos de um modo simples é do mais difícil que existe.

E para perceber o texto, vamos então imaginar que estamos perto de uns carris, e que um comboio se aproxima de nós a apitar. É fácil de perceber que conforme o comboio se aproxima o som aumenta mas não é tão fácil de entender porque é que o som que se aproxima é agudo (piiiiiii…) e que depois de passar por nós  torna-se grave (puuuuu…).

Este fenómeno foi explicado em 1842 pelo Físico Christian Doppler, e ficou conhecido pelo nome do autor. Muito simplesmente a onda sonora do apito comprime-se com a aproximação do comboio e expande-se quando este se afasta. Este fenómeno denominado efeito Doppler estende-se para tudo o que conhecemos na natureza. E as ondas eletromagnéticas não são exceção, daí o conhecido Redshift do Universo que indica que este está em expansão e a afastar-se. Utilizando o mesmo princípio, mas em sentido contrário, hoje é possível medir a chuva com o efeito Doppler, e o melhor de tudo é que a tecnologia evoluiu de tal modo, que hoje é possível ter um pequeno radar Doppler na palma de uma mão.

MRR, ou Micro Rain Radar, é um medidor de chuva que funciona com a emissão de ondas eletromagnéticas (24GHz FM-CW K-Band) na direção do céu, isto é, na vertical. As ondas ao baterem nas gotas que caiem refletem-se e voltam para trás (backscatter), e isso permite, que com cálculos numéricos sofisticados elaborar uma análise espectral dos desvios da frequência e calcular deste modo o tamanho das gotas, a sua velocidade e respetiva distribuição espacial ao longo do tempo.

Comparando com o som do comboio que se aproxima, percebe-se perfeitamente que as gotas de chuva maiores caem mais depressa, isto é, comprimem mais a onda, ou seja, desviam-se mais do centro da frequência emitida do que as outras gotas mais pequenas. Para que se saiba, os cálculos não são lineares e por isso o pequeno MRR tem no seu interior um poderoso microprocessador que faz os cálculos estatísticos e matemáticos necessários para estimar a chuva que cai num determinado momento.

Normalmente os MRRs conseguem medir diâmetro das gotas de chuva desde os 0.25mm a 4.5mm, e a titulo de curiosidade, e para quem não sabe, uma gota “grossa” de 4.5mm pode cair a 40km/h, e agora até é possível estabelecer uma  relação  estatística entre os diâmetros e a  intensidade.

Novas tecnologias de medição de pluviosidade

Embora esta tecnologia de medição possa parecer revolucionária é a sua fiabilidade e erro que mais interessam a quem quer medir chuva continuamente ao longo de muitos anos. Diga-se que a par da fiabilidade dos MRRs estão os disdrometros, como os de Impacto, Laser, Ótico, que também possuem um MTBF (Mean Time Between Failures) superior a 40000 horas, isto é, é espectável que todos eles operem mais de 4 anos sem quaisquer avarias. No outro lado da fiabilidade, e a título de exemplo, a experiência revela-nos uma taxa superior a 30% de avarias por ano nos chamados pluviómetros de relé Reed que se mostram muito suscetíveis a descargas atmosféricas.

Mas se o MTBF num disdrometro é definitivamente muito superior ao das básculas, os erros e as incertezas são também definitivamente muito menores. Por exemplo, se quisermos medir uma taxa de 1 mm/h num pluviómetro com uma báscula de 0.1mm precisamos de 1 hora e 10 basculações para garantir um erro inferior a 10%, ou seja, é necessário que na natureza chova 1 mm pelo menos durante uma hora para termos a certeza do erro. Pelo contrário num disdrometro é possível garantir um erro de 10% em menos de um minuto de leituras.

E para concluir é claro que a evolução tecnológica permitir-nos-á estimar com mais certezas as causas e os efeitos dos fenómenos meteorológicos extremos que, como se sabe, assolam cada vez mais o planeta em que vivemos.

Pluviometros de Radar Doppler