Crónica de um Amor Louco

Ornela Mutii - Tales of Ordinary Madness
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De manhã a Cristina entrou no quarto e perguntou-me com quem é que eu tinha sonhado nessa noite. Apanhado pensei eu.

Antes de continuar, devo explicar que aos quarenta anos pensava que se podia enriquecer com trabalho e por isso tinha dois empregos, e entre muitas outras coisas, elaborava projetos, dava aulas e fumava quase dois maços de cigarros por dia.

Numa bela tarde de outono o coração cedeu, entrou em fibrilação auricular e fui internado de urgência. Depois dum reset de 170 Volts e de uma noite terrível fui proibido de tocar no tabaco e evitar o café. E foi nesse mesmo dia que decidi de querer ser rico e estupido para viver a vida como ela é.

Devido a esse acidente, e para evitar outros iguais, sou medicado diariamente com um comprimido chamado Inderal. Um dos efeitos secundários do Inderal é a perturbação do sono e consequentemente dos sonhos. Até à data nunca tinha sonhado, ou se tinha, nunca me lembrava de nada. Com o Inderal tudo mudou, e dez anos depois, consigo lembrar-me dos sonhos e até controlá-los.

No início isso assustava-me, mas agora decido minimamente quem entra nos meus sonhos e como a história se desenrola. Infelizmente os fins são sempre imprevisíveis. Tales of Ordinary Madness,  em português Crónica de um Amor Louco, foi um dos filmes que mais marcou a minha juventude, e foi por isso que nessa noite sonhei com a Ornella Muti.

No sonho eu era o Ben Gazzara, o poeta louco e bêbado por quem Cass se tinha apaixonado. A vantagem do sonho é que o tempo é estático e sonhamos sempre com as personagens do nosso passado, por isso é que Ornella Muti, mesmo 30 anos depois, continuava linda com o seu sinalzinho no nariz.

Nos sonhos vale tudo e por isso a história era um pouco diferente do filme. Corri o filme e o sonho todo, como um louco, atrás de Cass com um agrafador para lhe agrafar a boca e o corpo.

Finalmente ela mergulhou no mar e eu acordei.

Que sonho idiota!